A cada passo, uma história. A cada quilômetro, uma vitória. A Maratona Brasília 2025, realizada nesta segunda-feira (21/4), foi mais que um evento esportivo: para muitos participantes, era um desfile de superações, de encontros e de momentos emocionantes que mostram que correr vai além da competição. Entre os inscritos, havia idosos cheios de energia, pessoas que venceram doenças, casais que, por amor, disputam juntos e gente que veio de longe para prestigiar um dos acontecimentos mais tradicionais do aniversário da capital do país. Em comum, todos carregavam no peito — além do número da inscrição — um motivo forte para cruzar a linha de chegada.
Dos muitos que estavam na prova, dois chamaram atenção, incialmente, pela fantasia de Homem-Aranha e, posteriormente, cativavam quem buscava saber a história da dupla, repleta de conquistas e amizade. Eram o professor de educação física Cristyano Martins, 39 anos, e seu ex-aluno João Vitor Silveira, 23, com paralisia cerebral.
A parceria começou há mais de uma década, quando Silveira cursava o ensino fundamental. “Foi numa viagem para Araxá, em Minas. Foi organizada uma corrida entre os alunos e ele me disse que queria participar, apesar das dificuldades de locomoção. Eu disse: ‘Se você quer, vamos'”, lembra Martins. O resultado surpreendeu. O jovem superou diversos colegas e cruzou a linha de chegada, ganhando a admiração não só do educador, mas de toda a turma.
O tempo passou, o estudante entrou na faculdade de educação física e, atualmente, está no sétimo semestre. E a amizade contribuiu para que objetivos do rapaz, cada vez maiores, fossem traçados no esporte. “Cada prova é um novo desafio. Comecei com 5 km, depois 10. Hoje, os 21. E quero fazer os 42 em breve”, disse Silveira, sorrindo. A preparação inclui musculação, natação e corridas três vezes por semana. “É muito legal. A chegada é sempre emocionante. Mostra que a gente é capaz”, contou o universitário, emocionado.
Outros participantes também compareceram à Maratona Brasília 2025, estimulados pela prática saudável, por relatos de pessoas que foram além de seus limites, entre outras revelações. Kazumi Yamamoto, 59, e Helenice Rodrigues, 64, são amigas, moradoras da capital federal e não escondiam o entusiasmo. “Foi maravilhoso. Eu sempre participo. O aniversário de Brasília é um dia especial”, afirmou Kazumi, que, após enfrentar um câncer de mama, encontrou nas caminhadas uma forma de celebrar a vida e cuidar da saúde. “Os médicos incentivam muito a prática de atividade física”, contou. Já para Helenice, mais do que uma competição, eventos como o de ontem representam um motivador coletivo: “Espero que tenhamos cada vez mais corridas e iniciativas assim.”
Veteranos
Os idosos também deram um show na competição. Aos 71 anos, Sandoval Rocha, por exemplo, mostrou que disposição não tem idade. Morador de Samambaia, ele cruzou a linha de chegada vencendo na categoria acima de 70 anos, após percorrer os 42 km da disputa. “Estou acostumado a correr. Teve subida, mas foi tranquila”, afirmou, com naturalidade.
Rocha corre há mais de duas décadas e tem um histórico de vitórias no DF. No ano anterior, ficou em segundo lugar, mas agora voltou ao topo do pódio. “Na outra, eu não estava tão preparado, mas costumo sempre chegar em primeiro”, contou, orgulhoso da trajetória.
A preparação, segundo ele, envolve treinos constantes e descanso antes da prova. Mas o segredo principal vai além da técnica: “É força de vontade e se cuidar. A gente vai aos poucos e chega lá”, aconselhou. A corrida, para ele, é mais que uma atividade física, é — como contou — um estilo de vida que inspira e desafia seus limites, ano após ano.
Outras atletas com experiência e que também marcaram presença eram Maria Lucena, 67, Ieda Bezerra, 60, e Lucimar Coelho, 58. Além de formarem um trio de moradoras de Taguatinga e serem amigas que praticam esse esporte de rua, asseguram que não pretendem largar a prática tão cedo. “Corro há seis anos. É muito bom para a saúde”, aconselhou Maria, com a disposição dos iniciantes.
Ieda, por sua vez, acrescentou haver estabelecido um meta ousada para 2025: “No ano passado, corri 10 km. Agora, marquei 21 km. É um desafio, mas quero chegar lá”. A preparação, segundo ela, envolve treinos semanais, musculação e muito foco. “É fantástico. Mentalmente, (correr) me ajuda demais”. E Lucimar arrematou reforçando o impacto positivo do esporte na vida das três: “É saúde, é energia, é tudo de bom. Comecem caminhando e vão se desafiando a cada dia. Vale a pena.”
“Importados”
Mas engana-se quem pensa que só brasilienses estiveram na maratona. Estela Cristina Vaz, 51, veio de Piracicaba, interior de São Paulo, especialmente para estrear no circuito do quadradinho e ficou em primeiro lugar na sua categoria. Servidora pública e ultramaratonista, ela encarou os 42 km como parte da preparação para um desafio ainda maior: a Comrades Marathon, tradicional prova na África do Sul. “A corrida, aqui, foi mais difícil do que imaginei. Brasília tem fama de ser plana, mas a prova não teve nada de plana”, comentou, rindo.
Com 14 anos de experiência no mundo da corrida, Estela enfrentou percursos extremos, com mais de 200 km. Mesmo assim, ela não subestima os obstáculos locais: “Aqui, o maior desafio foi a combinação de subidas, calor e a distância. Não é fácil”. Para Estela, correr vai além do esporte: é estilo de vida. “Comecei para sair do sedentarismo e perder peso. Hoje, é o que me move”, afirmou.
De Goiás para Brasília, a professora universitária Lúcia Ramos, 44, veio com a paixão pela corrida. Acostumada a participar com a família de provas esportivas, ela incentiva o filho Davi Ramos, de 11 anos, a seguir o hábito, objetivo apoiado pelo pai do garoto. “A gente pratica sempre e gosta de fazer isso em família. Um motiva o outro”, contou o marido, o técnico de segurança do trabalho João Francisco Ramos, 41, que encarou o percurso de 21 km.
“Adoro correr com meus pais. E ajuda na profissão que quero seguir. Vou ser jogador de futebol”, declarou o adolescente, empolgado para o início da prova. Ele e sua mãe fizeram o percurso de 5 km.
Completando os corredores visitantes que conversaram com o Correio, o veterano e capixaba Sochiro Schibata, 75, veio do Espírito Santo para sua sétima participação na prova. Ele disse que começou a correr aos 32, mas só estreou em competições aos 45. Segundo o representante do Espírito Santo, trata-se de algo mais que esporte: é filosofia de vida. “Sempre corro uma ou duas horas por dia. É um exercício para o corpo e para a alma”, resume. E mesmo admitindo estar “um pouquinho fora de forma” neste ano, garante que manteve os treinos, alternando corrida com caminhada. Com bom humor e perseverança, deixou um conselho simples e poderoso: “Comece devagar, mas não desista.”
Por Carlos Silva, Bruna Pauxis e Ana Carolina Alves do Correio Braziliense
Foto: Bruna Pauxis/CB/D.A.Press / Reprodução Correio Braziliense