Metade dos acionamentos de resgates atendidos pelo Corpo de Bombeiros do Distrito Federal (CBMDF) envolve pessoas que se perdem ou se machucam em trilhas e cachoeiras da região após passeios mal-planejados. Atraídos pelo desafio, pelas paisagens e pelo contato com a natureza, muitos aventureiros acabam precisando de helicópteros, equipes especializadas e até cães farejadores para sair da mata com vida.
Dados do Grupamento de Busca e Salvamento (GBS) mostram que, nos últimos três anos, os resgates em áreas de mata superaram até as ocorrências por afogamento e soterramento. Só em 2024, foram 63 chamados para socorrer pessoas perdidas ou feridas em trilhas; em 2023, foram 55, e em 2025 já são pelo menos 39 registros até julho. No total analisado no período, foram 157 atendimentos,
Os principais cenários desses incidentes são pontos turísticos bem conhecidos, como a Trilha do São Bartolomeu, a Cachoeira do Tororó, o Poço Azul, o Parque Nacional de Brasília e a Chapada dos Veadeiros. Também no Entorno do DF, locais como o Salto do Itiquira, a Chapada Imperial e as trilhas de Sobradinho concentram acidentes e pedidos de socorro frequentes.
O especialista em Busca e Resgate do Corpo de Bombeiros do DF, Moisés Cavalcanti, chama a atenção para os erros mais comuns que acabam em pedidos de socorro: subestimar os riscos do ambiente natural, consumir álcool, drogas ou medicamentos que comprometem a capacidade física e cognitiva, superestimar a própria resistência e se arriscar em manobras perigosas — como saltos e selfies em locais instáveis. Mas para ele, o mais grave é a ausência de um guia experiente para orientar o grupo.
Cavalcanti reforça a importância de nunca fazer trilhas sozinho e de levar o kit básico para se manter seguro: água suficiente para todo o percurso, alimentos leves e energéticos, roupas e calçados adequados ao terreno (como legging e tênis de corrida), lanterna para situações de pouca luz, apito para sinalização, um kit simples de primeiros socorros e um celular carregado com bateria extra ou power bank.
Resgates desafiadores
No dia 23 de fevereiro de 2025, um jovem de 27 anos decidiu explorar uma trilha perto da cachoeira Véu da Noiva, no complexo Poço Azul, em Brazlândia. O drama começou quando ele perdeu o equilíbrio e caiu, machucando o pé esquerdo, sozinho não conseguia mais retornar da mata. O local era de difícil acesso, e o resgate precisou de cinco horas de esforço intenso para imobilizá-lo e levá-lo até o hospital.
Já no dia 10 de junho de 2023, uma mulher de 26 anos decidiu praticar rapel na Cachoeira do Tororó. No entanto, um erro durante a descida resultou em uma queda de cerca de 18 metros, causando uma fratura exposta no tornozelo e um corte profundo no cotovelo. A complexidade do local exigiu um resgate que durou seis horas, com uso de tirolesa para retirar a vítima e transporte por trilha até a ambulância. Apesar do acidente, ela foi levada consciente e estável ao hospital.
Entorno
Na Chapada dos Veadeiros, as trilhas noturnas são um dos maiores testes para quem visita a região. Guiados apenas pelas estrelas e pela luz de lanternas, os visitantes se lançam em um percurso onde a natureza se mostra sob uma perspectiva completamente diferente — sons, sombras e a sensação do desconhecido tornam o passeio emocionante.
“A noite a visibilidade é muito limitada, o terreno pode ser traiçoeiro e qualquer deslize pode se transformar em um acidente. Além disso, o risco de se perder aumenta”, conta Gilson Pacheco, de 41 anos, que atua como guia turístico há oito anos na região.
São as pousadas, muitas vezes, as primeiras a perceber quando uma trilha terminou em problema. A maioria dos turistas avisa na recepção que vai sair para caminhar mas, quando não volta no horário ou no dia seguinte, é o pessoal da pousada quem dá o alerta. “É aí que a pousada liga para os bombeiros”, conta.
A orientação profissional, segundo ele, faz toda a diferença para evitar esses casos. Gilson monta roteiros personalizados, levando em conta idade, condicionamento físico, peso, experiência prévia e até traumas. “Acho que tem certos medos que já não são enfrentar desafios, mas tocar em feridas do passado mesmo. Isso eu respeito muito na hora de montar o roteiro”, finaliza.
Por Por Brasília
Fonte Metrópoles
Foto: Arte/Metrópoles